João Lourenço visita Portugal com uma postura tão arrogante, tão seguro de si, que certamente nenhum político português terá a ousadia de lhe perguntar quando é que o Estado angolano paga os cinco mil milhões dólares que Angola deve a Portugal.
Por Paulo de Morais (*)
Esta dívida foi originada com os sucessivos desfalques no Banco Espírito Santo (Angola) – BESA, resultantes de créditos concedidos, sem quaisquer garantias, a dignitários do MPLA antes de 2014.
Um dos grandes beneficiados foi justamente João Lourenço, que agora parece ter-se esquecido das dívidas que ele mesmo e os seus amigos de então contraíram, sem devolver nem um dólar.
Os empréstimos sem garantias concedidos em Angola, à época pelo BESA presidido por Álvaro Sobrinho, estão aliás na origem do descalabro no sector financeiro português. Foi um fartar vilanagem: empréstimos concedidos a personalidades ligadas ao MPLA. No topo da lista estava Marta dos Santos, irmã do ex-Presidente.
Mas o conjunto de bafejados pelo BESA com muitos milhões é extenso, com destaque para o próprio João Lourenço, França Ndalu ou Roberto Almeida.
No início da década, muitas aquisições de angolanos em Portugal terão sido mesmo realizadas com o capital do BES, desde participações na Banca a aquisição de fábricas ou herdades. O escândalo foi de tal dimensão e o capital incobrável era de tal ordem que, em 31 de Dezembro de 2013, o Estado Angolano prestou uma garantia autónoma a favor do BESA, com um valor de 5,7 mil milhões de dólares. Esta garantia nunca foi accionada. Até hoje. Nem sequer foi dada qualquer explicação sobre o seu destino.
Há anos que este é um assunto tabu, em Angola e Portugal. Em Angola, porque o poder é absoluto, corrupto e tendencialmente censório. Em Portugal, porque a classe política é submissa aos interesses de Angola, como se tem provado nos últimos tempos.
Bastará ter observado a postura do presidente português Marcelo e do Primeiro-Ministro Costa no caso “Manuel Vicente”, processo de reiterada corrupção, que foi transferido de Lisboa para Luanda, por inadmissível pressão política dos políticos portugueses sobre o seu próprio sistema de Justiça.
João Lourenço tem proferido, de há meses a esta parte, diversas proclamações contra a corrupção, o que é positivo; mas ainda sem qualquer resultado visível. Neste âmbito, vem defendendo a recuperação dos capitais que saíram de Angola por via da corrupção, nomeadamente os que foram canalizados, durante anos, para Lisboa, uma verdadeira lavandaria de dinheiro sujo angolano.
Aplaudo essa iniciativa e espero por resultados. Resultados rápidos. Até porque, em Portugal, os empréstimos que financiaram investimentos imobiliários em território nacional são de fácil recuperação: liquidação dos créditos ou confisco imediato das propriedades. A este movimento deve ser associado o bloqueio das contas bancárias aos angolanos perseguidos pela Justiça e o subsequente confisco dos capitais, se tal se justificar.
Mas estes capitais recuperados não deverão ser entregues a Angola de mão-beijada. Deverão, em primeira instância, reverter para o pagamento dos prejuízos causados aos milhares de vítimas dos créditos concedidos pelo BES Angola à oligarquia angolana. Devem ser utilizados em indemnizações aos depositantes e obrigacionistas do BES, em Portugal; e até deverão servir para compensar os pobres contribuintes portugueses, que todos os anos continuam, com os seus impostos, a pagar estes desmandos.
Infelizmente, temo que tal não venha a suceder. Porque João Lourenço já meteu os políticos portugueses num bolso: Marcelo parece infantilmente deslumbrado com a confiança com que de repente Lourenço o presenteia; António Costa foi recentemente a Angola prestar vassalagem ao novo Presidente e à sua corte. Entretanto, o Parlamento português rende-se ao seu discurso e até a Câmara de Lisboa faz de João Lourenço cidadão honorário. Estranha esta situação em que o devedor (Estado angolano) capturou o credor (políticos portugueses).
Toda a classe política portuguesa o bajula; e bajulará. Ninguém ousará dizer a mais meridiana das verdades: Angola deve muito dinheiro a Portugal e um dos culpados é o actual presidente João Lourenço.
(*) Presidente da Frente Cívica